Bem pessoal, o retorno as atividades e a readaptação a vida louca das grandes metrópoles por onde ando acabou atrasando essa postagem, desculpem, mas vamos lá….
Logo que o ferro tocou a lama em frente ao povoado do Galeão colocamos o bote na água e fomos desembarcar com os amigos do veleiro Red Sea que reencontramos por lá. Nesse tempo se aproximaram dois policiais uniformizados, a bordo de seus jet skis, perguntando se pretendíamos pernoitar por ali. Informamos que sim mas eles sugeriram, gentilmente, que mudássemos de idéia pois existe lá uma rota de tráfico de drogas entre Valença e o povoado do Galeão. Essa “atividade” é feita através de lanchas velozes a noite, e cruza justamente a área onde fundeamos e colocaria em risco nossa tranquilidade. Imediatamente o encanto pelo lugar acabou.
Vila do Galeão
Igreja Do Galeão
Galeão é um lugar bem simples e bonito visto do barco sobre as águas do rio Tinharé. Chama atenção pela Igreja que existe no topo de um morro e que deve ter uma vista espetacular de toda a ilha de Tinharé e região. Ainda desembarcamos na intenção de fazer a trilha que leva a Igreja, mas o desconforto com aquela informação que afetava diretamente nossa segurança foi maior. Voltamos para o Nimbus, suspendemos o bote e nos colocamos na rota para Gamboa a aproximadamente 6 milhas dali ( em tempo aproximadamente 1 Hr ).
Como já era fim de tarde usamos um pouco mais de potência no motor do que de costume para tentar chegar na Gamboa com alguma luz, pois todo o caminho entre Cairu e Gamboa é repleto de bóias , normalmente de garrafas pet , que marcam os manzuás ( artifício de pesca local ), e difícil de visualizar a noite. Mas durante o curto trajeto uma nuvem cumulonimbus passou por nós cheia de energia com muita chuva restringindo absurdamente a visibilidade. O vento chegou a picos de 28kt. Com a visibilidade prejudicada pela chuva reduzimos a velocidade e Dandan acendeu todas as luzes possíveis. O canal é relativamente estreito e o trânsito de embarcações de transporte de turistas entre o Morro de São Paulo e Valença é grande, e muitas vezes são lanchas velozes.
A claridade se foi prematuramente por conta da chuva, e por alguns minutos nos orientamos apenas por instrumentos. Essas nuvens tecnicamente conhecidas como CB’s e chamada de pirajás por nós velejadores se deslocam rapidamente e quando são isoladas ( maioria das vezes ) passam rápido, não mais de 20 ou 30 minutos.
E a chuva chegou
Fundeamos na Gamboa, e lá ficamos por três dias. No período noturno quando estávamos ancorados na Gamboa, acendíamos além da luz do tope a luz de deck que ilumina o convés do Nimbus do mastro para frente e o deixa bem visível. Isso nos fazia dormir mais tranquilos pois um mês antes o veleiro Odô Yá foi abalroado fundeado por uma enorme embarcação de madeira usada no transporte de pessoas. Felizmente como é um barco de aço os danos foram pequenos mas segundo o relato do Breno, se fosse um barco de fibra o estrago teria sido grande.
Nesse tempo fundeado na Gamboa fomos caminhando na maré baixa até o Morro de São Paulo, lá passamos o dia com um casal de amigos de Salvador, Felipe e Mila.
Mila e Felipe
Para entrar em Morro quem chega de barco ou acessa pelo atracadouro é determinada uma taxa que é aplicada lá faz bastante tempo. Resumindo, se quiser entrar na vila tem que pagar R$15 por pessoa, ou então volta nadando pois o barco que te trouxe a essa altura já foi embora no momento em que fica sabendo da taxa. Acho que é por que pagamos poucos impostos no Brasil e Morro que faz parte do município de Cairú deve ser carente dessa renda. Interessante que para entrar na cidade onde moro em Lauro de Freitas e em tantas outras cidades que recebem turista não é cobrado nada. Mas enfim…. A dica é a seguinte, na maré baixa fomos caminhando pela praia até próximo a ponte de atracação onde param os barcos trazendo turistas de Salvador, Guaibim e Valença que são os pontos de acesso por terra mais próximos. Um pouco antes de chegar ao atracadouro existe uma barraca na praia chamada One love, junto a barraca há uma trilha que encurta caminho e já vai sair direto na vila, sem a cobrança do “pedágio” , a caminhada é agradável, vale a pena. Para quem só vai passar o dia lá é uma boa, trilha bem tranquila e com um visual bonito da região. Para voltar pegamos um saveiro de transporte no atracadouro do Morro para o da Gamboa. Senti vontade de voltar correndo para o Goió e Sapinho na baía de Camamu depois de ter pago R$120 reais para almoçar uma mini moqueca e 5 numa água de coco.
Morro de SP
Falésias
Da Gamboa saímos no nascer do sol e inicio da vazante como de costume. Mar de poucas ondas e sem vento. Motoramos até a Ilha de Itaparica, aproximadamente oito horas de viagem de fundeio a fundeio. Fomos recebidos de volta na barra da Baía de Todos Santos por um dia lindo de céu limpo e um sol que penetrava com seus raios nas águas daquela baía calma. Surpreende um pouco a quantidade de navios fundeados entre a ilha de Itaparica e o porto e Salvador, nesse dia contei 19, era uma sexta-feira. Haviam tantos que um estava fundeado barra a fora. Me lembro quando moleque que contava 3 no máximo quatro, mas se quisermos continuar usando componentes importados e queimando combustível fóssil não podemos reclamar desse progresso.
Saindo de Morro
Chegamos de volta em casa, Itaparica. Ainda que não tenhamos conseguido realizar por completo o nosso plano de conhecer Paraty com o Nimbus é impressionante a sensação de estar entrando no portão de casa quando avistamos o farol da barra passar o nosso través, vindo do mar aberto.
Em Itaparica fomos recepcionados pela tripulação dos veleiros To Indo e Anne, que nos convidaram para almoçar um peixe em terra, excelentemente preparado pela dona Dete. Vale ressaltar que a tripulação do To Indo composta pela Cindy e o Comandante Gerson são verdadeiros guias da costa do Brasil, especialmente da região de Angra e Paraty. Nos deram excelentes explicações sobre o que iríamos encontrar, os riscos a serem evitados, as rotas, os points, entre tantas outras informações da região onde navegaríamos. E esse conhecimento ainda vamos utilizar com certeza. Obrigado Gersão e Cindy.
No quintal de casa.
Entrando na Baía de Todos os Santos
Em Itaparica , também encontramos o Cirrus ( Deda acompanhado do seu dog ), o Lalat, o Dysdobre, reencontramos o Green Nomad ( que conhecemos no Goió ) e outros veleiros familiares. A maré morta com pouca correnteza faz Itaparica ainda mais espetacular, a água fica mais cristalina o que ajuda bastante no trabalho de limpeza do fundo do barco que aproveitei para fazer. A noite da chegada foi na pastelaria que nunca fecha, próximo a igreja na companhia de Gerson To Indo.
Sábado 23/11/13, dia seguinte a nossa chegada, encontramos Levino e Claudia da lancha Praieira. Ele que é velejador mas está numa fase lancheiro. O jeito foi comer uma pizza em terra e depois no cockpit do Nimbus um happy hour regado a vinho e ao som do violão que dividi com Levino excelente “violeiro”.
No Domingo fomos passear de lancha a convite da tripulação da Praieira, visitamos a Ponta do Dourado, passamos raspando nas coroas da Ilha de Medo andando a 20kt com 2 metros de profundidade, Levino quase me mata de medo! Depois fomos a Ilha dos Frades e retornamos no fim da tarde para Itaparica.
Happy hour no Nimbus
Havíamos combinado de retornar para o Aratu Iate clube nesse mesmo domingo dia 24/11 mas quando vimos os outros barcos saindo de tardezinha precisando voltar para assumir os compromisso da segunda-feira que nós, na ocasião, não tínhamos, resolvemos ficar e retornar só na segunda e assim sentir o gostinho de ter o tempo como aliado.
Segunda-feira dia 25/11/13 como de rotina no verão que se aproxima a manhã foi espetacular. Daqueles dias que temos vontade de ficar só olhando o azul do céu, as poucas nuvens que vão passeando leves, o mar espelhado ainda pela falta do vento. Fomos convidados a almoçar no veleiro Ati Ati. Lá o cardápio foi peixe e siri, regado a um espumante espetacular. O almoço se prolongou até a noite e às 19 horas levantamos a âncora do Nimbus, adriçamos suas velas ainda nas proximidades da marina de Itaparica e demos uma excelente velejada em uma noite clara até a entrada da baía de Aratu.
Então depois de 27 dias volta ao cunho de proa do Nimbus a laçada da amarração no Aratu Iate clube. Chegamos às 23 horas. Jantamos uma batata gratinada com recheio de calabresa e tomate feita por Dandan no trajeto, espetacular. Depois o sono dos justos.
Estar no mar é só felicidade!
Sem atingir o objetivo principal da viagem por motivos que já foram explicados anteriormente tivemos uma das melhores férias até então. Sem precisar de aeroporto, sem precisar dirigir, enfrentar engarrafamentos e pedágios, apenas conhecendo e aproveitando a natureza compreendida entre duas das maiores baías do Brasil, a de Camamú e a de Todos os Santos.
Mas nos preparando e preparando o barco para uma viagem que não aconteceu por completo aprendemos muito. Aumentamos nosso conhecimento sobre manutenção em diversas áreas fazendo os serviços no barco com as própria mãos. Aprendemos que o relógio da natureza é diferente do relógio dos homens e que o ideal mesmo é navegar com tempo disponível ( esse é o maior obstáculo ).
Os agradecimentos aos que ajudaram a acumularmos tanta felicidade são tantos que fico com medo de não mencionar alguém mas aqui vão alguns.
Dandan
A cada dia me surpreende mais como tripulante, sem ela certamente não conseguiríamos ir mais longe que o farol da barra. Sempre crescente seu conhecimento de navegação, gps, piloto automático , ajuste de velas, regras de tráfego marítimo, meteorologia, cozinha a bordo, manutenção, domínio do barco entre outras habilidades desenvolvidas. E sempre me ajudando nas decisões e me enfrentando de forma a apontar meus erros, aumentando bastante a segurança a bordo. E me colocando para cima quando as dificuldades aparecem.
Meu Pai, Edson. Consertando, melhorando e inventando peças para o barco. Parando tudo a qualquer momento para dar atenção e capricho nos detalhes tornando o Nimbus um barco mais seguro e confiável. Dando assistência remota nos serviços a bordo de todas as áreas, por telefone e até por skype. Me senti muito mais seguro sabendo que grande parte das manutenções do Nimbus tiveram a sua participação, através de revisões de algumas peças, conserto de outras e construção de muitas. E o monitoramento via satélite da posição geográfica para o nosso plano combinado de emergências.
Minha Mãe, Dona Maria Idalina. Pelo preparo carinhoso das diversas refeições que foram levadas a bordo congeladas as quais sempre levantavam o astral quando estávamos navegando cansados e aquele cheirinho da comida de casa exalava.
Ao Nimbus, que nos passou bastante confiança, seguro, veloz quando as condições favorecem e que nos abrigou durante esses 27 dias a bordo e que tomou uns bons tapas de mar sem deixar nada se quebrar.
A tripulação do To indo mais uma vez, pela paciência e recepção a bordo com verdadeiras aulas sobre Angra, Paraty, Búzios e outros assuntos.
A tripulação Avoante pelo incentivo e desmistificação do mar.
A Lucio Ventania pela balsa salva-vidas que aumentou a tranquilidade em caso de um imprevisto grave longe de terra.
Ao Stormy pelos pirotécnicos novinhos.
A Léo Lacrau pelos bate papos com dicas de mar.
A Hélio e Mara do Maracatu pelas dicas também da região de Angra e Paraty e rota.
Ao Kakali pela rede das frutas e botas.
É a outras pessoas que posso não ter lembrado.
Bem…. Agora já coloquei o relógio de volta no pulso, o celular na carga. A mala que só tinha camiseta, short e sunga voltou a carregar terno e gravata. E da rotina a bordo já sinto saudades.
O fato é que o mar nos chama e na medida do possível estaremos sempre perto dele e tentando ir mais longe , conhecer novos lugares e pessoas.
Veleiros às vezes são como as tartarugas, são lentos mas se deslocam suave na água carregando sua casinha nas costas. 🙂
Um abraço a todos e vamos para o mar!!
Tiago Menezes